Romances na Cidade


Fugi do encontro, não deu. O homem, barba por fazer, vestia uma calça rancheira, camiseta preta tipo hering. Parecia ter pego a primeira roupa que viu no armário, pasta à tira-colo. Como sempre. Sorria mas parecia que não estava lá. Como sempre. Não me viu, ou fez que não me viu. Chamaram-lhe a atenção. Viu. Ela, cabelos escovados, vestia uma calça rancheira, uma blusa preta, sem mangas e de malha. Estas roupas que as mulheres usam no dia-a-dia da cidade. Sem grandes ornamentos, maquiagem ou outra coisa qualquer destinada à sedução. Parecia ter pego a primeira roupa que viu no armário, bolsa a tira-colo. Olhou, mas era como se não me visse. E os dois juntos combinavam, mas não brilhavam. Pareciam uma alegoria fantasmagórica de uma Paris do Segundo Império. Um mês de namoro e não brilhavam.
Uma conta que, para mim, ficava ainda mais esquisita na medida em que eu ia me lembrando de todo o cuidado que eu tinha em escolher a vestimenta do dia, como se todos os dias fossem dias de lua de mel, todos eles muito especiais ao lado do homem que me acompanhava a vida. E assim íamos levando os nossos encontros semanais, diários quando dava: roupas tiradas do armário a dedo. E eu cuidava de tudo, do decote no lugar certo só para sentir a pele lisinha do rosto dele, que ele cuidava com tanto zelo só para poder grudá-la meu colo quando ele vinha para se aninhar. Os dias iam passando e a beleza do primeiro encontro permanecia. Mantínhamos os olhos fogosos, até mesmo quando banalmente entrelaçávamos os dedos ao andarmos pelas ruas da cidade, discutindo sua arquitetura. Sete anos depois, dia após dia, ainda brilhávamos um para o outro. Terminamos assim, como nossas melhores roupas jogadas no chão do quarto, ao lado da cama, corpos em gozo como da primeira vez.
Os romances da cidade. Naquele dia, a sentença me veio de chofre, como se de minha profecia eles não pudessem escapar: “estes não duram sem brigar até o natal, onde a coisa vai balançar, o ano novo vai passar e no carnaval sabe-se lá”.
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