Quem quiser, que me siga!


Estava lendo uma matéria sobre Hermeto Pascoal, quando comecei a relembrar os vários “encontros musicais” que tive com o Bruxo – como é chamado pelos músicos, também seus admiradores:
1. Boca da Noite
Uma das vezes foi no Boca da Noite, um dos maiores botecos - na qualidade musical - que existiram em São Paulo, e onde quase todos os artistas da música brasileira se apresentaram, além dos excelentes músicos (da casa) que, toda as noites, garantiam o melhor da MPB.
Mas do que falávamos mesmo ? Ah, sim! De Hermeto Pascoal.
Foi em um domingo à noite e, daí que no outro dia seria segunda-feira, o popular “dia de branco”. Mas em uma das mesas, o Hermeto, que resolve, em certo momento, dar uma canja, vai até o piano e começa a tocar Dindi (o clássico de Tom Jobim e Aloysio de Oliveira). Daí uma cantora (a memória não ajuda com o nome dela, mas me lembro que é a irmã da cantora que foi morta pelo Lindomar Castilho) também resolve colocar um ingrediente na canja e com sua linda voz complementa aqueles que foram minutos de mais bela arte musical.
Na hora de ir embora eu disse para ele:
- Isto que você fez vai fazer a gente viver mais uma quinze anos! - E ele me respondeu, dando um abraço forte:
- “Quinze anos não! Quinhentos anos!” - E soltou aquela gargalhada maravilhosa.
2. Festival de Águas Claras
Outra vez foi no ano de 1.982 no Festival de Águas Claras, ah!, que bela lembrança do nosso Woodstock Brasileiro ou, melhor ainda, do nosso Woodstock Caipira. Três dias e noites do melhor da música em diversos gêneros e estilos, com milhares de pessoas em uma fazenda, e na melhor convivência. As apresentações do Gilberto Gil e do Egberto Gismonti merecem comentário outro dia; mas do que falávamos mesmo? Ah, sim! De Hermeto Pascoal.
A sua apresentação começou por volta das 23 e continuou até as 5 da manhã. Eu fui dormir um pouco e, quando acordei, vi que o som não parava. Lembro que ele reclamava não conseguir afinar os instrumentos devido ao frio que fazia (durante o dia era um sol de “lascar”, à noite esfriava muito e minha reserva de Domec foi fundamental para a resistência). Como foi bom amanhecer ouvindo Hermeto Pascoal...
3. SESC (Paulista)
Uma outra vez foi no projeto de música instrumental do Sesc Paulista onde o Bruxo se apresentou sozinho, acompanhado apenas dos seus “instrumentos” (panelas, latas de água, assobios, bexigas, torneiras, serrotes e outros totalmente convencionais para ele).
Foi um êxtase total, culminando com um Parabéns a Você ao som da sua barba, isto mesmo: molhou a barba e com as mãos puxando os fios conseguiu tirar o som, encerrando com o comentário:
- “Vou ficar uma semana com a barba doendo mas valeu a pena”.
Eu que o diga!
4. Quem quiser, que me siga!
Uma apresentação no Sesc Pompéia terminou, ou melhor, continuou com ele falando:
– “quem quiser, que me siga!”
Hermeto desceu do palco junto com seus músicos e, puxando uma caminhada musical, saiu do teatro, passou pela ruas internas do Sesc, prosseguindo pelas ruas. Puro deleite!
Aconteceram outros “encontros”, sempre geniais e gratificantes.
Ah! teve um no teatro da FIESP e no final ele lançou o desafio tradicional: “quem quiser, que me siga!”. Já se dirigia à avenida Paulista (na época a entrada e saída do teatro eram por ai) quando a segurança simplesmente fechou a porta do teatro impedindo mais um “happening”. Impedindo apenas nas ruas porque a “doideira” continuou por um bom tempo, ali mesmo no hall.
É por essas e outras que não é difícil Ser-tão Paulistano. Tudo é simples, muito simples, principalmente quando este alagoano, lá de Lagoa de Canoas, faz com que a cidade seja mais musical, mais amiga...
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