CAIPIRA BLUES

... e nas nossas andanças pelo ser-tão, um trinado peculiar de cordas nos reteve a atenção: o bluseiro Woody Mann, junto ao violeiro Matuto Moderno Ricardo Vignini. O quê? Um gringo no pedaço? Pois sim! Nos quase distantes anos 1970, o missioneiro Noel Guarany, bradou lá do Pampa:

“Verão que as raças se uniram, num potencial varonil
Pra levantar o Brasil, índios, gringos e mestiços...”
(Noel Guarany, Destino Missioneiro, LP, 1973).

Pois que o gringo Woody Mann nos proporcionou uma experiência sonora única. Herdeiro da tradição dos grandes, por suas cordas perpassam ecos de Big Bill Broonzzy, Son House, Mississipi John Hurt: lamentos, irreverência, alegria de folguedos, cenas de estradas solitárias, de bares fumacentos e barulhentos, de cerveja gelada. Por vezes, sabe-se lá por quais volteios da alma, salta cá um tanto de música celta e até de viola sertaneja, cenas áridas das caatigas...

E quando o violeiro Ricardo Vignini sobe ao palco, algo de familiar nos sacode: a violinha caipira não se fez de rogada e travou interessante diálogo com o violão, com direito a trechos alucinantes d’O Trenzinho do Caipira, de Villa-Lobos. E ao interpretarem um tema do Índio Cachoeira, a batida da violinha, alinhada aos floreios do violão, evocaram imagens simultâneas de plantações algodoeiras do delta do Mississipi às plantações de café de minha infância e até mesmo as modernas plantações de cana do oeste paulista; cenas de antigos westerns, pôr-do-sol visto das margens Ribeirão Caigang – que no linguajar subdialetal caipirês do oeste paulista é chamado Córrego Canganha! - , onde nasci e que o Índio Cachoeira, nascido também na região, certamente conhece...

Enfim, em tempos globalizados, nada mais universal do que cantar nossa aldeia, como diria o bardo luso, o Pessoa...

... e enquanto isso, rolava no Teatro da Vila e no Teatro da Praça, outros shows imperdíveis. Ser-tão Paulistano é isso. Pena a gente não poder estar em toda a parte, como o sertão...
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