Com Monica Albuquerque, chove horta da música brasileira.


O uso de frases feitas, ditos populares, lugares comuns é um artificio dos mais manjados. Sei disso, tenho consciência que é para encobrir a falta de criatividade e, bem no popular revela uma pobreza de escrita. Se não for uma falta de respeito pode ser atualizada  a orientação biblica para os dias de hoje: "perdoai os pobres da escrita, porquê será deles o reino dos blogues". Estou, de antemão, salvo e posso dizer que "uma imagem e um som valem mais de mil palavras" para transmitir a emoção e a felicidade total de ver, entre vários, o vídeo da Monica Albuquerque cantando Chovendo na Roseira. Uma das mais belas interpretações de uma das mais belas canções de Tom Jobim. 

A perfeita integração da alegria de cantar e tocar, a sintonia da verdadeira interpretação única da Monica com a virtuosidade dos músicos Peu Passos e Robson Russo. A felicidade, de novo a frase feita, "estampada nas faces". Robson Russo que, sempre que a gente se encontra faz questão de lembrar de quando foi apresentado ao inconfundível e paulistano churrasquinho grego. Após uma show da Daniela Lasalvia na Galeria Olido fomos tomar a, necessária e complementar, cerveja naquele bar-boteco do Largo do Paissandu. Lá pelas tantas sugeri o churrasquinho grego como tira gosto e o Robson educadamente concordou em experimentar. Anos de caminhadas pelo centrão, contumaz fã  e apreciador do saudável petisco  jamais senti alguma reação estomacal, apregoada pelos "quinta coluna" do considerado petisco . Parece-me que o organismo interno do Robson não acolheu bem o preparo de carne, vinagrete e pão frances. Coisas de "marinheiro de primeira viagem". Mas, voltando à musica, "quem não pode se sacode" ou "quem não dança segura a criança" e como "não sou bobo nem nada" pedi ajuda ao, este sim um craque das letras e companheiro aqui do sitio do Ser Tão, Joel Joca Ramiro para escrever aquilo que a Monica Albuquerque é e merece. Joel Joca Ramiro este sim um milionário da escrita. 

"Sempre acreditei que música é mais que entretenimento: música é exercício de nossa sensibilidade, é também informação, é história. Ouvir uma peça antiga, digamos, barroca ou medieval, se possível com instrumentos de época, é imaginar os recursos disponíveis então, é imaginar os pares em movimento,  os gestos e os olhares. É sabido, por exemplo, o porquê das então chamadas “cantigas de amigo”, cuja primeira referência – entre nós brasileiros – é a cançoneta do Elomar de mesmo nome, apesar de a dita “cançoneta” não ser essencialmente uma típica “cantiga de amigo”, tal como se executava na época medieval: Cantiga de amigo era como se chamavam as cantigas de amor que as damas destinavam a seus amados: mulher direita não podia se dirigir ao dono de seu coração como amor, mas sim, amigo. Revela a condição feminina de então, sua posição e seu papel na sociedade. Uma dama de alta linhagem, protótipo da rainha do lar, fiel e companheira exemplar, abdicava de tudo, a começar pelo prazer. Ainda nos dias de hoje, a última instituição medieval que resiste aos tempos, a Igreja, condena o prazer carnal: oficialmente, sexo só pode ser praticado com o fito de procriação, pendenga ainda viva e presente. Naqueles idos tempos, as “cantigas de amor” eram largamente produzidas e cantadas nas situações de “amor cortesão”, que mesmo sendo chamado “o fino do amor”, eram amores proibidos ou ilícitos. O que fazer com os versos de amor destinados às grandes damas? Eram escamoteados sob o nome cantiga de amigo. Em oposição às cantigas de amigo, os criativos poetas de então compunham as cantigas de escárnio, a desconstrução do chamado amor cortês.

Lembrei-me das Cantigas de Amigo assistindo outro dia ao Mosaicos da TV Cultura onde uma morena de longos cabelos negros interpreta lindamente uma das mais conhecidas peças do cancioneiro elomariano: Arrumação. Nesse mesmo programa outras mulheres interpretam Elomar, mas a voz de Monica Albuquerque marcou-me, aquela sonoridade atemporal, delicada na medida exata, a voz sertaneja emprestada ao tema característico, sem se deixar carregar pelo sotaque estereotipado , tentação fácil de seguir, à qual Monica abdicou, preferindo impor seu estilo, sua personalidade e assim, Arrumação - talvez a cantiga mais gravada do bardo baiano – ganhou sabor de novidade, magnetizada.


Monica brinca com a voz e com os instrumentos, com os músicos, encanta quem a ouve: brinca e se diverte, diverte e emociona, ensina, se exercita e nos exercita com voz que encanta, seduz, como na interpretação abaixo mostrada, versão especialíssima do clássico Chovendo na Roseira. 



Como acontece com a maioria dos artistas que possuem trabalho de cunho autoral, é desconhecida do grande público, o que é uma pena. Vale demais conhecer seu trabalho, sua arte, que é mais do que entretenimento, como abordamos no inicio desta postagem".

Monica Albuquerque tem o Cd gravado, “Essakisoueu – Um Anjo a Toa”, que pode ser adquirido através de seu site oficial:


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