CONSUELO DE PAULA E AS "BIBIANAS"




Dentre os muitos nomes possíveis para Consuelo de Paula denominar seu próximo show no Teatro da Rotina, na próxima sexta-feira, 09 de março, “Bibianas” não poderia ser mais acertado. Heroína, Musa, Guerreira, Mulher, Mãe, tudo isso  é Bibiana, amalgamada em figuras quase mitológicas no imaginário, imbuídas, entretanto, na carnadura de mulheres reais que conhecemos historicamente como  Anita Garibaldi, Maria Quitéria, Dolores Ibárruri, Maria da Fonte, a própria Boudica, a Rainha Guerreira, cujo martírio numa batalha impossível contra as forças romanas que ocupavam a Grã Bretanha nas primeiras décadas de nossa era foi o marco inicial da nacionalidade daquela gente.

No palco do simpático e agradável Teatro da Rotina, lugar que só tem gente bonita, Consuelo reunirá muitas “Bibianas” de nosso tempo e lugar, parceiras, amigas. Será a terceira apresentação d’Os Movimentos de Amor e Luta, que junto ao “Chamamento”, marca mais uma transformação da cantora e compositora, que prepara mais um CD, que promete ser revolucionário, em sua inquieta carreira.


“Bibianas” será mais que homenagem às mulheres. É a afirmação, em comitiva, da fibra e ternura, beleza e sensibilidade. Nesta Comitiva juntam-se tantas outras: Damiana da Cunha, a lendária líder dos cayapós, a conhecida Maria da Penha, a cientista Mari Curie, a primeira laureada com o Premio Nobel. Figuras simbólicas e exemplares da presença da Mulher na História. Engana-se quem pensa que o protagonismo feminino veio com o direito ao voto ou com o feminismo dos anos 60. A propósito, tais movimentos, icônico dos tempos modernos, na verdade figuram mais como estratégias de marketing, eficiente, diga-se, do que força efetiva na busca pela igualdade. A Revolução Feminina tem a idade da civilização:

- Desde Maria, a mãe de Jesus, fazendo acrescer mais um elemento à Santíssima Trindade, tornando-a uma Quaternidade, embora a Igreja nunca tenha reconhecido o fenômeno. Mas basta ver o inequívoco símbolo da cristandade, a Cruz, para supor que as quatro pontas da Cruz podem ser identificadas como Pai Filho e Espirito Santo, e a Mãe!

- Durante os anos sombrios da Idade Média, brilhou a luz de Hildegaard von Bingen, monja, filósofa, compositora.

- Angela Davis, desafiando o status quo;

- Em finais do século XVII, em pleno domínio hispânico no Novo Mundo, em plena Inquisição, sóror Juana Inès de La Cruz tornou-se a figura erudita  mais importante de seu , igualando-se em prestígio ao grande poeta Quevedo.

 - Nos tempos pioneiros da musica, Bessie Smith, Memphis Minnie impunham-se num mundo masculino, ousando vender milhões de discos. Alguém acha Madonna contestadora e ousada? Precisam conhecer  Josephine Baker, perto de quem Madonna seria uma comportada menininha. Em seu tempo, Baker foi capaz de por o mundo de pernas pro ar! E temos por aqui mesmo, dona Helena Meirelles, que daria um excelente longa metragem. E Mestra Virginia, a “...falada mestra, que trouxe a função de reisado?”

                                                         Josephine Baker, anos 1920
                                                         Bessie Smith


                                                              Mestra Virginia
                                                           
O palco do Teatro da Rotina estará lindo, todo coberto de pétalas coloridas. Abram alas. Estarão representadas as milhares de mães,  operárias, camponesas, guerrilheiras, executivas, poetas, maestrinas, soldadas. Ouviremos as vozes cansadas mas fortes das “mães da plaza de mayo”.
Mas quem for ao Teatro da Rotina não vai ouvir discursos inflamados (pode até ocorrer, mas não será a pauta predominante).
Consuelo de Paula, com seu belo e cativante sorriso, chamou “Bibianas” suas parceiras e inspiradoras que aceitaram de pronto o convite para generosamente compartilhar seus movimentos de Amor e Luta. Com ela estarão: Katya Teixeira, Thamires Tannous, Daniela Lasalvia, Andréia Preta, Duo Flor de Maracujá, Ângela Quinto e Graziella Nervegna.

                                                         Katya Teixera e dani Lasalvia

As poderosas e lindas vozes falarão de luta, de justiça, mas sobretudo de Amor. A obra de todas elas, assim como das milhares ou milhões de anônimas que lutam e que amam, e que por isso são imprescindíveis, assumem dimensões sobre-humanas. Preludiam a celebração que se inicia no dia oito e que deve prosseguir por todo março afora, vida a fora.
Quem for ao Teatro da Rotina, em cada acorde, em cada nota, haverá de perceber ecos de Chiquinha Gonzaga -  não por acaso parenta distante de Consuelo -  que lá das alturas celestiais estará sorrindo, aplaudindo a continuadora de sua obra.

Nessa noite de 9 de março, generosamente Consuelo deverá mostrar pérolas de seu novo CD, que deverá chamar-se Maryákoré.
Mariákoré pode ser visto como  um enigma, as palavras juntam-se, metaforseiam-se cabalisticamente diante de nossos olhos, seus mistérios aos poucos nos são revelados.

 “Maryákoré” nos remete a Maria – nome que por si muito explica e também primeiro nome da artista, que nos seus primeiros tempos na cidade de São Paulo se apresentava como Maria Consuelo. A palavra contém o grande e misterioso Mar, que liga continentes, em vez de os separar. Contém igualmente “Yakoré”, nome próprio africano. “Koré”, em dialeto paresí (uma nação indígena), significa flecha. A expressão separada “oré” quer dizer nós e nos parece que bom augúrio que seja a palavra final: nós!!

Consuelo cumpre sua sina de inconformada que recusa zonas de conforto. Abdica do sucesso fácil em nome dos mergulhos vertiginosos: já viajou entre Céu e Mar, entre o Sol e o Vento. Sua voz doce santifica o samba, a seresta, o baião, a toada, a congada.
Já dançou negritudes, latinidades. As letras, as palavras curvam-se perante ela, toda ela poesia!

Com “Maryákoré” aproxima-se sutil, respeitosamente da musicalidade indígena, que se trata de algo muito à flor da pele, pois a musica, a palavra, o som para o indio, é algo que abarca todo o ser. É uma "musica" visceral, puramente "orgânica, onde não se faz presente a nostalgia africana ou a razão européia. Por isso, faz tanto sentido, para nós, a confluência onde nasceu tão poderosamente a miscigenação brasileira, amalgamada, unica, como tão bem definiu Darci Ribeiro. Nossa cultura, nossa brasilidade se re-criou, não foi transplantada, como o foi, em outros lugares. Nossos artistas, que captam de maneira tão pura e original, nos dão esperanças e somos gratos. Ver e ouvir Consuelo e as "bibianas" nos confirma isso.
O novo CD da mineira de Pratápolis, do qual breve deveremos ter mais noticias, é aguardado com carinho e ansiedade. Sabemos que a galêga de alma cigana armou sua tenda  num trecho do caminho que trilha há quase três décadas e se prepara para esculpir mais uma torre em forma de musica.
Ou melhor, abre a porta de sua imensa “Casa” para nos mostrar a lindeza de sua sala, o lugar de honra onde cabe o Brasil inteiro. Ou muitos, muitos outros brasis...

Olê, olerê, Olará!!!!!



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