São João

É, São João “doidão” já passou. E com ele Santo Antônio e São Pedro. Teve fogueira, teve bandeirinha feita em casa, com papéis de seda coloridos nas cores vermelha, amarela, laranja e verde, com cola e barbante. É fácil, mas cansa. Primeiro a gente recorta as bandeirinhas, depois estica o fio, passa cola em cada uma dela e as gruda no barbante, uma por uma, dobrando a borda do papel de seda. Tudo isso alternando suas cores e o formato binário zero, um, zero, um, zero, um. Às vezes a gente erra, mas também fica bonito o tipo zero, um, zero, um, zero, zero, um. E pronto! Quatro ou cinco horas depois, estão todas prontas, como um varal, para serem penduradas. Daí é um tal de sobe e desce de escada de pedreiro que parece não ter fim. Os pregos vão a marteladas na parede, e viram gancho de prender barbante. É fácil porque é só ir cruzando o varal de bandeirinhas de um lado pro outro. Mas cansa porque a gente também carrega a escada de pedreiro de um lado pro outro. Sobe e desce; carrega! Sobe e desce; carrega! Sobe e desce; carrega! Mas é gostoso. Fica tudo muito bonito, e bem colorido.

Depois de armada as barraquinhas - pra caso de chuva e também para ter um espaço bem ajeitado pras comidas típicas: pinhão, vinho quente, canjica, bolo de fubá, cuscuz, arroz doce, milho verde, pipoca, amendoim, torta disso, torta daquilo, doce de abóbora, e de batata – a vez de montar a fogueira que, para não estragar o piso, foi parar em cima de um carrinho de pedreiro. Idéia boa, dada em conjunto. Achado o suporte da fogueira, saímos em busca da lenha a bordo do meu super Ford ka. Eu e Zé, grande Zé. Um terreno baldio aqui, outro acolá, e o primeiro carregamento não deu nem pro cheiro. Entre uma ida e uma vinda, perto de um poste, um feixe com várias ripas de madeiras, todas amarradas, prontas para levar. Como parecia ter sido por encomenda, não perdemos tempo. Daí foi só mais um carregamento, na construção vizinha, para garantir um bom fogo noite adentro.

Quase hora da festa, a parte mais gostosa: tomar banho, dividir as tranças e prender umas fitas coloridas, um batom vermelho e um pó nas bochechas. A saia azul ficou recheada de bandeirinhas coloridas - imitavam um arraial -, que passei a semana fazendo. Pendurei outras tantas na blusa vermelha. Calcei as botas e foi só esperar o Giba chegar com a viola e contar seus causos antes do bingo e no meio de muita prosa.

As Tradições Juninas... Um pouco de história...


Então, vamos lá. 13 de junho, dia de Santo Antônio. 24 é São João e 29 é dia de São Pedro. O primeiro era português, o segundo era primo de Maria e o terceiro, amigo de Jesus. Santo Antônio é casamenteiro. São João, festeiro e São Pedro, protetor dos lares. Ou, dizendo de outra forma (li em algum lugar), o primeiro corresponde a Ogum, o segundo à Xangô e para o terceiro, Exu. O que Ogum, Xangô e Exu tem a ver com Portugal, Maria, Jesus eu ainda não sei.

Sei que estes festejos, de caráter cristão, chegaram ao Brasil a partir da colonização. É que em 1500, lá na terrinha, as festas de São João eram o centro das comemorações juninas. Não é que - nesta terra aqui em que já dizia tão famosa carta que se plantando, tudo dá - as coisas de lá, juntaram-se com as tradições indígenas? Bingo! As rezas cristãs e os rituais de abundância, de fertilidade, de estreitamento dos laços de parentescos (o que combina bem com Santo Antônio). Duas vezes bingo! E não é que o fogo do São João coincidia com o fogo que limpava as matas, fertilizava os solos e afastava os espíritos malígnos? Viva! Três vezes bingo! É, pois é, não é a toa que se trata de festa tão popular.

Diz a história que Isabel prometeu sinalizar, para Nossa Senhora, o nascimento de seu filho João Batista. E faria isso ascendendo uma fogueira para ser vista ao longe. Um fogueirão, eu diria. Já as bombinhas de São João, é uma metáfora. Contam que Zacarias ficou tão alegre com a notícia de que seria pai que até perdeu a voz. No dia que seu filho nasceu, perguntaram-lhe como ele se chamaria e ele, num grande esforço, respondeu "João", e foi uma barulheira das grandes, com muitos vivas de todos os lados. Daí as bombinhas.

Ok, ok, mas e o compadrio? Opa! Esta é fácil. É que até 1950, 70% da população brasileira vivia nos campos. Éramos, de fato, um país rural e vivíamos em grupos familiares (muito além de pai, mãe e irmãos, a parentada toda: tios, primos, sobrinhos, netos, sobrinho-netos e sei lá mais quantas outras combinações, o primo do primo do primo etc e tal). Então o compadrio servia para integrar outras pessoas à família, estreitando os laços entre vizinhos, patrões e empregados, até mesmo do escravo com o senhorio. Um batismo aqui, uma fogueira acolá e compadres e comadres iam se ajeitando. Bonito era ser compadre de fogueira. Nas festas de São João, dois deles pulavam as brasas, em sentido cruzado e de mãos dadas. São aqueles irmãos que a gente ganha em vida, os amigos pra valer. Dizem que os balões de São João serviam para enviar recado ao santo. Já a quadrilha apareceu só depois, meados do século XX e tem origem francesa. Bingo de novo, com a dança de pares e os casamentos caipiras (ou matutos).
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